sábado, 29 de julho de 2023

Karmann-Ghia

Karmann-Ghia Type 14, 1962

Três companhias estão envolvidas na história do Karmann-Ghia. Em meados dos anos 1950 a Volkswagen produzia o VW Sedan (Fusca) - o “Carro do Povo”, como Hitler o chamava - e a recuperação do período pós-guerra aumentava as vendas do Besouro. Os executivos da Volkswagen precisavam aumentar a linha e estavam buscando um “halo car”, aquele carro que chamava atenção do público e criava nas pessoas o desejo de adquiri-lo. Decidiram que o estilo seria desenvolvido pelos italianos, e esse carro especial seria construído fora das instalações em que o Fusca era produzido. 
Wilhelm Karmann havia assumido o comando da Karmann Karosseriewerk, empresa familiar de encarroçadores, e tinha a terceirização da produção de modelos conversíveis da Volkswagen; já Luigi Segre foi designado para expandir a reputação internacional da Carrozeria Ghia & Gariglio, fundada em 1915 por Giacinto Ghia, e assumida por Mario Boano depois de sua morte em 1944.


Wilhelm Karmann e Luigi Segre se encontraram muitas vezes nas exposições internacionais de automóveis, e numa delas, em 1952, a Volkswagen propôs que os dois desenvolvessem um modelo na plataforma do Fusca. Gian Paolo, filho de Mario Boano, comprou um Fusca em Paris e o levou dirigindo até Turim. Segre customizou a plataforma do Fusca e montou um protótipo em apenas cinco meses. Levou o carro secretamente para Paris, onde o apresentou a Wilhelm Karmann na Societé France Motors (distribuidor da VW na França e único distribuidor na Europa para comercializar modelos da Ghia/Chrysler).

Quando Wilhelm viu o cupê, disse: “Eu gostaria de construí-lo!”. Segre então passou todas as especificações do projeto para Karmann, que por sua vez, iria apresentá-lo à Volkswagen.





Mario Boano, Sergio Coggiola e Giovanni Savonuzzi foram creditados como designers do novo carro, em diversas vezes. Porém, o desenho elaborado pela Ghia trazia vários elementos que lembravam o protótipo Chrysler D’Elegance de Virgil Exner, na época diretor de Design da Chrysler, que a Ghia havia sido incumbida de construir, em que Mario Boano havia trabalhado anteriormente. 
O perfil do Chrysler D'Elegance lembra o design do Karmann-Ghia,
especialmente a linha do teto e os para-lamas traseiros

As proporções do Chrysler eram tipicamente americanas,
exigindo um ajuste no tamanho do carro


De acordo com o filho de Exner, Virgil Exner Jr., Savonuzzi foi encarregado de reduzir a escala do D”Elegance, visto que ele era um típico carro americano, bem maior do que os habituais europeus. Savonuzzi suavizou as linhas da frente, eliminando a grade e arredondando o bico como um barco. O Type 14 (como sua designação interna) foi mostrado  em outubro de 1953 no Paris Auto Show, como um conceito de estilo da Ghia.

No final, o trabalho dos designers era terceirizado, em especial nos carros conceitos, que não entraram em produção, davam a eles uma certa liberdade de “copiar” soluções de estilo de um projeto para outro; e uma atribuição definitiva sobre a autoria do estilo do Karmann-Ghia nunca foi feita, tanto pela VW como pela Ghia.


Segre e Exner eram próximos pelos trabalhos que realizavam e acabaram ficando amigos. Peter Grist, biógrafo de Virgil Exner conta que quando Exner viu o Karmann-Ghia pela primeira vez em 1955 “ele ficou satisfeito com o resultado, e feliz por um de seus projetos ter se tornado um modelo de grande escala de produção”. Chris Voss, um estilista do escritório de Exner, realtou em 1993, que ele considerava o Karmann-Ghia como uma lisonja. Segre, por sua vez, enviou a Exner o primeiro exemplar de produção do Karmann-Ghia que foi importado nos Estados Unidos, como uma expressão de gratidão.

O protótipo apresentado à diretoria da VW foi bem recebido, e a primeira apresentação aos concessionários ocorreu em 14 de julho de 1955, no Hotel Cassino Georgsmarine, e a apresentação ao público foi no Salão de Frankfurt, do mesmo ano.

Em agosto de 1955, o primeiro Type 14 foi construído em Osnabrück, Alemanha. A recepção do público excedeu às expectativas da empresa, e mais de 10 mil unidades foram vendidas no primeiro ano.

Diferentemente do processo usado no Fusca, com painéis soldados e parafusados, a carroçaria do Karmann-Ghia era moldada à mão, os painéis soldados, num processo mais demorado para obter maior qualidade, resultando assim, num preço mais alto, quase o dobro do preço do Fusca. Só a frente do carro era formada por cinco partes, que tinham de ser soldadas e com acabamento para ser uma única peça.


Inicialmente equipado com o motor boxer, quatro cilindros e 1.200 cc do Fusca, com 36 hp; mas com uma aerodinâmica melhor do que a do Fusca, atingia 80 mph (128,7 km/h). O chassi foi alargado em 4 polegadas para acomodar a carroçaria mais larga, acrescentada uma barra estabilizadora na suspensão dianteira, além de novos amortecedores e novas barras de torção. O motor ganhou 4 hp em 1961. O belo visual não recebeu muitas mudanças no decorrer dos anos, apenas detalhes como as lanternas traseiras, que aumentaram de tamanho e tiveram alterações devido às normas de segurança dos Estados Unidos. Tinha 1,33 m de altura e 4,14 m de comprimento, com um peso de 820 kg, o pequeno motor boxer era suficiente para rodar, mas não se podia dizer que tinha o desempenho de um carro esportivo.


No mesmo ano de 1961, a VW havia lançado o Type 3 (que aqui no Brasil ficaram conhecidos como o TL e a Variant), então projetaram um novo Karmann-Ghia, baseado neste chassi, desenhado pelo italiano Sergio Sartorelli, posicionado num mercado superior ao Karmann-Ghia original, e vinha com o motor boxer de 1500 cc. O modelo oferecia um espaço maior na cabine, com três espaços de bagagem: o dianteiro, atrás dos bancos, e agora um espaço junto ao motor traseiro; o estilo era mais retilíneo, e era o VW mais rápido daquela época. O Type 34 recebeu em 1962 o teto solar operado eletricamente, o segundo carro do mundo a receber este equipamento. As lanternas traseiras eram redondas, vinha com faróis de neblina de fábrica, recebeu um relógio elétrico no painel, e um interior com painel e laterais acolchoados mais luxuosos, além de apoios de braço nas portas. Ele ficou conhecido como “o grande Karmann” na Alemanha, “Razor Edge Ghia” no Reino Unido, ou “European Ghia” e “Type 3 Ghia” nos Estados Unidos; apesar deste modelo não ser oficialmente exportado para lá, muitos acabaram nas terras do Tio Sam via Canadá, e o país tem registros aproximados de que cerca de 2.000 exemplares chegaram aos Estados Unidos, dos quais se confirmam 400 exemplares remanescentes hoje. Os Karmann-Ghia Type 34 também foram produzidos nas instalações  de Wilhelm Karmann, e ambos os modelos foram interrompidos quando o Porsche 914 substituiu os Karmann-Ghia como os modelos esportivos da VW.


Em 1965, vieram os freios a disco nas rodas dianteiras, e em 1966 a potência subiu para 53 hp. Em 1968, uma transmissão semiautomática foi disponibilizada como opcional. Em 1972 o motor aumentou para 1584 cc, com 60 hp, nos mesmos quatro cilindros boxer, e o Karmann-Ghia atingia agora 90 mph (144,8 km/h).

A partir de 1957, foi disponibilizado o modelo conversível, ou cabriolet, e ambos permaneceram em linha até 1975. Durante 20 anos, foram produzidos 445.000 exemplares, dos quais 80. 837 eram conversíveis.

O Karmann-Ghia no Brasil


O modelo começou a ser fabricado no Brasil em 1962, exatamente pela Karmann-Ghia, empresa formada para produzir o carro no Brasil. A produção atingiu 41.689 unidades, dos quais 23.393 eram cupês, apenas 177 conversíveis, e 18.119 do modelo TC.

Inicialmente era idêntico ao Karmann-Ghia alemão, feito na plataforma do Fusca, com as suas adaptações, e mesma motorização, boxer de 1200 cc. O conversível veio em 1967, e permaneceu como o único automóvel nesta configuração, até o lançamento do Escort XR3, em 1985.

A propaganda posicionava o Karmann-Ghia
como um carro de estilo, e não um esportivo.

Recebeu o motor 1500 cc em 1967, e o 1600 com dupla carburação, em 1970. Por aqui a Puma, e vários outros pequenos fabricantes começaram a montar modelos esportivos baseados no chassi e motor do Fusca, com relativo sucesso, pois as importações de carros foram proibidas em 1975; motivando a VW a fazer um upgrade para o Karmann-Ghia.



Ao invés de trazer o Type 34, como seria lógico, a VW do Brasil resolveu projetar um novo Karmann-Ghia, e contratou Giorgetto Giugiaro para criar um novo Karmann-Ghia, o TC (Touring Coupé). Internamente conhecido como Type 145, ele trazia um estilo que lembrava o perfil do Porsche 911, mas com linhas mais retas.
Começou a ser produzido em 1972 e durou até 1975. Era um cupê 2+2 com um interior moderno e confortável; assim como o Type 34, usava a plataforma do 1600 Type 3/Variant, em vez do Fusca. Vinha também com o motor boxer 1600cc, que produzia 65 hp a 4600 rpm e atingia 138 km/h de velocidade máxima, comparado aos 34 hp e 116 km/h que o anterior alcançava. O Karmann-Ghia TC foi produzido somente no Brasil, e não foi exportado para nenhum outro país. Um exemplar protótipo hoje está na coleção do Museu da Karmann, em Osnabrück, Alemanha.



O Karmann-Ghia nas pistas do Brasil

Os anos 1960 foram brilhantes no automobilismo brasileiro, com a consolidação da indústria automotiva, vários fabricantes tinham equipes oficiais competindo nas provas, principalmente no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. A Vemag, Simca e Willys competiam entre si,e colaboraram para que os pilotos brasileiros se destacassem, a ponto de irem para a Europa no final dos anos 1960.

A VW não tinha equipe oficial, mas alguns Fuscas e Karmann-Ghias participavam, sem muita preparação. Até que Paulo Goulart, engenheiro formado pelo Mackenzie e dono da Rampson, indústria de componentes de alumínio, trouxe um motor do Porsche 95-SC da Alemanha, e o instalou num Karmann-Ghia, sem muitas adaptações. A suspensão ganhou novos ajustes, e logo começou a fazer sucesso nas pistas, e se refletiu no mercado, pois muitos queriam mais desempenho no belo, mas tranquilo Karmann-Ghia.

As vitórias apareceram, com a primeira vitória no Rio de Janeiro. Goulart emprestou seu carro para Chico Landi, e ele venceu os 1000 km da Guanabara, em julho de 1964. Mas não levou, porque o regulamento do Automóvel Club do Brasil o classificava como um carro especial, considerado um protótipo. Mas Goulart ficou tão entusiasmado com isso que vendeu sua parte na Rampson e assumiu o comando da Dacon, fundada em 1960.

A equipe crescia com a vinda de José Carlos Pace e Anísio Campos, que ajudou a construir uma carroceria do Karmann-Ghia em fibra de vidro, ficando com apenas 650 kg, e com a instalação do motor do Porsche 904, com cerca de 200 hp e quatro comandos de válvulas, virou um foguete que chegava facilmente aos 200 km/h.

O motor se encaixou sem problemas no cofre do Karmann-Ghia, mas ficou sem o capô, pois os grandes carburadores e o sistema de escapamento ocuparam todo o espaço. As rodas foram trocadas pelas Kron Prinz de 165x15 na frente e as enormes 210/80x15 atrás.

O carro venceu com Pace, na prova Prefeito Faria Lima, em Interlagos, foi segundo na inauguração do Autódromo Internacional do Rio de Janeiro, e repetiu a vitória nos 1000 km da Guanabara, desta vez com Wilson Fittipaldi/Ludovico Perez, e Pace/Totó Porto em segundo.

Em maio de 1967, nos 1000 km de Brasília, em 23 e 23 de abril, os KG-Porsche tiraram os três primeiros lugares no pódio, trazendo glória para Paulo Goulart e os pilotos: Moco e Wilsinho em primeiro, de ponta a ponta; Emerson e Chico Lameirão em segundo, e Lian Duarte/Rodolfo Olival Costa em terceiro.

Foi a última vitória da Equipe Dacon, mesmo com o sucesso nas pistas, a VW não investiu nas corridas pois não queria que seus carros fossem conhecidos pelo desempenho, mas pela confiabilidade e durabilidade, o marketing da época. A Dacon seguiu como revenda da VW, representante da Porsche em São Paulo, e personalizava outros modelos da VW, até o seu encerramento definitivo, em 1996.

Da minha coleção



O Karmann-Ghia da Hot Wheels, da Série First Editions de 2006


O mais antigo da coleção é um Hot Wheels, na escala aproximada de 1:62, bem-preparado, com um aerofólio enorme na traseira e a tampa do motor removível, junto com o scoop acima do teto, e os para lamas alargados. Ele é de 2006, saiu na Mainline em prata e com os decalques em preto, rodas normais.

O outro vermelho metálico é da Maisto, na escala aproximada de 1:53, um casting caprichado, com rodas especiais e pneus de borracha, e abre o capô do motor, cujo detalhamento deixa a desejar, não parece um motor boxer da VW.

Karmann-Ghia 1966, Maisto, escala 1:53

O vermelho com teto branco é da Johnny Lightning, com bom nível de detalhamento, vem com rodas esportivas, mas estão lá os cinco furos, como era no original.

Karmann-Ghia, 1965 - Johnny Lightning, 1:62
O azul é da Jada, também numa escala perto de 1:50, bem acabado, casting bem proporcionado e customizado, sem para-choques, e rodas especiais com pneus de borracha. As aberturas da grade ficaram um pouco desproporcionais, mas no geral, é uma bela miniatura.
Karmann-Ghia, Jada Toys 1:50

Karmann-Ghia da Yat Ming em 1:18


O Karmann-Ghia 1966 na escala 1:18 é da Yat Ming, abre as portas, capô dianteiro e do motor, que tem um detalhamento básico. A pintura é bem feita, os cromados são corretos, faróis e lanternas detalhadas, e o design das rodas reproduzem as da época, bem estreitas para um modelo esportivo.

Referências:

https://hotwheels.fandom.com/wiki/Volkswagen_Karmann_Ghia

https://orangetrackdiecast.com/2016/12/07/car-culture-track-day-volkswagen-karmann-ghia/

https://www.premierfinancialservices.com/2017/12/01/model-masterpiece-1952-chrysler-delegance/

https://www.conceptcarz.com/images/Chrysler/52_chrysler-Elegance_dv-18-eh-d03-800.jpg

https://www.motorverso.com/karmann-ghias/

https://www.maxicar.com.br/2016/12/karmann-ghia-auto-sensualidade/



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